sábado, 3 de novembro de 2012

FUNCIONALIDADES APARENTES E INTENÇÕES DIFERENTES DE UMA MÃO


esclarecimento:  este texto ao contrário de outros foi escrito por encomenda de um espectáculo de música e de teatro e dança, sobre a violência doméstica.

para além de tudo, está escrito para ser declamado na primeira pessoa com uma interpretação teatral
que me obrigou a escrever de uma outra maneira...não tem a mesma liberdade caótica que gosto de ter....


FUNCIONALIDADES APARENTES E INTENÇÕES DIFERENTES DE UMA MÃO


a mão que atravessa
o hálito das bocas
que se beijam intensamente
e num silêncio cúmplice
de paladar escrito de emoção partilhada

e planta essa mão um gesto
de carícia em desvio no rosto de quem supostamente ama

é a mão que que carrega fúria
desanimo, ansiedade
frustração, carência, fraqueza

é a mão que endurece 
e é pedra rígida
que bate e cai
no mesmo rosto

a mão que rompe o hálito
de duas pessoas a menos de um metro de proximidade
transporta em si
mais que a fúria e a rigidez que a violência se orgulha em ter

ela dizima confiança
retira-lhe as vestes de tranquilidade
que a confiança veste de maneira pomposa

neste balanço
sabemos que a mão que desfila a carícia e faz emocionar mulheres
é a mão que fere como pedra e que faz cair mulheres

há que providenciar esclarecimento
nesta aparente funcionalidade

a mulher que ama
não vê na perfeição, 
tem óbvios problemas de visão, 
ela não consegue ver nada que se lhe depara
desviante da cor rosa que observa em todos os actos da pessoa que supostamente ama

é esta ingenuidade imbecil que colocaram no adn da mulher
que lhe perturba a paz que sonha
e que não vai ter
porque a sua força é a grande fragilidade
acreditar no amor

e ver cor de rosa onde está cinzento

aos homens que partilham hálito
com as mulheres

indiquem o "manual de utilidade e função de uma mão"
a mão não é hostil
a mão não é bélica
a mão é apenas uma mão
complemento final de uma extensão de braços, dois por sinal
que auxiliam
o homem nas suas tarefas de quotidiano

no dia em que a mulher se desviar
da trajectoria em linha recta do olhar de um homem
quando este levanta o braço e articula marcação de movimento com a mão
é sinal que ficou estilhaçado
o encanto do que é belo e que é amor